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domingo, 19 de agosto de 2018

Brasil não pode violar tratados e Lula é candidato

Por EUGÊNIO ARAGÃO - Procurador da republica e ex-ministro da Justiça do Brasil

Eugênio Aragão

As instituições do estado brasileiro sempre tiveram uma relação de amor e ódio com o direito internacional. Por um lado, a aristo-burocracia que as povoa adora viajar para o exterior, se gaba de lá ser ouvida em palestrinhas a justificarem a prática de tirar casquinha do serviço público, à base de diárias em dólar e passagens em classe executiva. Adora falar de seus passeios em Portugal, na França ou na Itália; cita autores jurisconsultos desses países com uma saudade que não consegue definir, misturada com complexo de inferioridade e enche a boca para entremear seus rasos discursos com palavras ou frases de efeito em francês, inglês ou alemão. Sente-se importante quando assume algum protagonismo em cooperação internacional. Regozija-se com elogios vindos de fora. Realiza-se nos favores prestados a autoridades estrangeiras. Nisso, chega a ser sabuja.

Por outro lado, detesta ser chamada à responsabilidade. Enquanto o direito internacional servir para justificar passeios a serviço, seminários sem fim regados a coffee-breaks, enfeite em currículos profissionais e status privilegiado na carreira, ele é festejado como solução para os problemas nacionais. Quando, porém, órgãos de monitoramento de tratados expõem a pouca seriedade de nosso trato com compromissos assumidos, nossos aristo-burocratas se irritam com aquilo que sentem ser uma ousadia, um topete ou um desaforo, batendo na tecla de nossa soberania e de nossos interesses nacionais.

O judiciário brasileiro é bem assim. Principalmente sua cúpula. Desdenha profundamente a responsabilidade internacional do estado brasileiro. Não se sente nem um pouco vinculada às obrigações internacionais. Estas são um problema a se jogar no colo do Itamaraty, mas, jamais poderão condicionar ou direcionar seu modo de decidir. De certa forma, vê em sua sacrossanta independência de “poder constitucional” uma espécie de soberania pós-westfaliana, com ilimitada competência de guerra. Desrespeita as instâncias internacionais e pronto. Ninguém pode com essa intangível cúpula judiciária. Foi assim com sua declaração de constitucionalidade da lei da anistia para torturadores e assassinos da ditadura; foi assim com a visita da relatora especial sobre execuções sumárias, Asma Jahangir, que, por fazer críticas ao descompromisso de juízes com direitos humanos, teve recusada audiência com o presidente do STF; ainda é assim com a cooperação com o Tribunal Penal Internacional, tida como à margem da Constituição – e por aí vai.

Esse repúdio elitista e prepotente a “pressões externas”, contudo, nos torna insignificantes nos foros internacionais. Somos uns anões pouco levados a sério. Não entendemos que o respeito de outras Nações advém da capacidade de nosso estado demonstrar com persistência sua boa fé no cumprimento da palavra empenhada.

A Constituição brasileira, em seu art. 4°, ao arrolar princípios que devem reger as relações internacionais mantidas pelo país, se furta do mais importante cânone do direito das nações, a tal boa fé no adimplemento das obrigações assumidas com outros estados, conhecido, também, por princípio do “pacta sunt servanda”. Talvez isso seja uma demonstração de como o Brasil enxerga no seu discurso jurídico internacional mero exercício de retórica. É comum tornarmos parte de um tratado que venha a nos impor obrigação de legislar como seu objeto mais relevante e empurrarmos essa tarefa com a barriga por anos a fio. Assim foi com a Convenção da ONU contra s tortura de 1984, ratificada pelo país em 1989. Somente em 1997, oito anos depois, nós demos ao trabalho de colocar em vigor a Lei n° 9.455, que tipifica o crime de tortura. No caso do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional de 1998, ratificado em 2002, até hoje não foi editada a lei sobre a cooperação com essa corte. Enquanto isso, o Brasil não tem como cumprir um sem número de obrigações ali assumidas. Fica o dito pelo não dito.

Faço essas observações a propósito da advertência de órgão da ONU que, nesta semana, o governo brasileiro tornou pública através de sua missão permanente em Genebra, para que o direito de Lula participar das eleições presidenciais seja respeitado. Pelo documento, solicita-se “ao estado-parte que tome todas as medidas necessárias para garantir que [Lula] goze de e exerça seus direitos políticos enquanto em prisão, como candidato às eleições presidenciais de 2018, incluindo o acesso apropriado à mídia e aos membros de seu partido político; assim como que não se impeça que concorra às eleições presidenciais de 2018, até que os recursos pendentes para revisão de sua condenação tenham sido completados em procedimentos judiciais justos e a condenação tenha se tornado definitiva”. A advertência foi feita no bojo de um procedimento que tramita no Comitê de Direitos Humanos do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (PIDCP) de 1966, a respeito de violações sofridas por Lula em diversos de seus direitos no curso da persecução penal contra si promovida no judiciário pátrio.

O Brasil se tornou parte desse tratado em 1992, comprometendo-se a respeitar e fazer respeitar os direitos ali reconhecidos. Para acompanhar o progresso dos estados-partes na implementação das obrigações assumidas, o PIDCP conta com um órgão de monitoramento, que é o Comitê de Direitos Humanos que advertiu o governo brasileiro. Por força de dispositivo do tratado, o Comitê pode receber petições individuais tratando da violação de direitos pelos estados-partes. Esse mecanismo existe porque o estado-parte concorda soberanamente com ele, adere às cláusulas que estabelecem sua competência.

Ao advertir o governo brasileiro, o Comitê exerceu prerrogativa que o Brasil livre e espontaneamente lhe reconheceu ao ratificar o tratado e ao expressamente admitir o recurso a petições individuais. Ninguém, pois, está indevidamente se intrometendo nos assuntos domésticos do país. Ninguém está exercendo pressão ilegítima sobre nossas instituições. O Comitê faz aquilo que o estado brasileiro lhe outorgou soberanamente fazer.

É claro que nenhum estado adere a um mecanismo desses achando que só vale para “os outros”. Ao ratificar o pacto com previsão de se permitir que indivíduos vítimas de violações de direitos possam acorrer ao Comitê, é curial que a parte deve admitir a possibilidade de ser cobrada por eventual não cumprimento de obrigações.

Note-se que o PIDCP foi assinado e ratificado pelo executivo dentro de sua atribuição constitucional de manter relações com estados estrangeiros e organizações internacionais. Mas foi também aprovado pelo legislativo, o que lhe confere status de norma interna, vinculante para todos os órgãos do estado - executivo, judiciário e o próprio legislativo.

O PIDCP é lei em sentido amplo ou, mais precisamente, é norma com vigência supralegal, na jurisprudência dominante do STF. Vale mais do que lei ordinária e complementar, por força do art. 5°, § 2°, da Constituição, segundo o qual “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. Vale por isso, o pacto, mais do que a lei das eleições, a lei das inelegibilidades ou a lei de execução penal. E o intérprete maior de suas disposições é o Comitê de Direitos Humanos ali expressamente previsto.

O Brasil concordou com tudo isso e reconheceu, nesse esforço de amoldar nossa prática estatal a estândares internacionais de direitos humanos, os direitos expressos no art. 25 do PIDCP, segundo o qual

“Todo cidadão terá o direito e a possibilidade, sem qualquer das formas de discriminação mencionadas no artigo 2 e sem restrições infundadas.

a) de participar da condução dos assuntos públicos, diretamente ou por meio de representantes livremente escolhidos;

b) de votar e de ser eleito em eleições periódicas, autênticas, realizadas por sufrágio universal e igualitário e por voto secreto, que garantam a manifestação da vontade dos eleitores;

c) de ter acesso, em condições gerais de igualdade, às funções públicas de seu país”.

É interpretação corrente do Comitê de Direitos Humanos que esses direitos têm vigência, também, para pessoas que respondem a processo penal, presas ou não, enquanto não houver condenação transitada em julgado. Esse entendimento, por sinal, coincide plenamente com o sistema de presunção de inocência adotado em nossa Constituição, que além de estender essa presunção (“princípio de não-culpabilidade”) a todo trâmite do processo antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória (art. 5°, LVII), aplica-a para o gozo dos direitos políticos, que só podem ser suspensos após a condenação definitiva.

Não vale apelar, aqui, para a tal lei da ficha limpa e nem ao entendimento distópico  do STF de se poder executar pena provisoriamente após completado o duplo grau de jurisdição. É que o Brasil não pode opor nenhuma norma doméstica – leis complementares ou ordinárias – à vigência do pacto, a pretexto de deixar de cumprir suas cláusulas. Esse é um princípio geral de direito internacional inscrito no art. 27 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 1969 (ratificada pelo Brasil em 2009) – “uma parte  não pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar o inadimplemento de um tratado”.

Não faz qualquer sentido, por tudo que aqui foi dito, a discussão pública que se iniciou tão logo a advertência foi disseminada na mídia, sobre se seria, ou não, de se cumprir a determinação. No Brasil dos dias atuais cumprir a lei se tornou algo sobre o que as instituições se deram o direito de transigir. Cumpre-se apenas se convém à “opinião pública” devidamente “refletida” – melhor,  pautada – pelos meios oligopolizados de comunicação. O “gesundes Volksempfinden” (sentimento popular são) tomou o lugar das normas postas, como na prática do famigerado tribunal popular (Volksgerichtshof) do Terceiro Reich.

É nesse contexto que cumpre interpretar declaração do Ministro da Justiça daquilo que se convencionou chamar de “governo Temer”, segundo a qual a advertência do Comitê de Direitos Humanos teria “nenhuma relevância jurídica”, qualificando-a como “intromissão política e ideológica indevida em tema técnico-legal” (apud “Painel da Folha”). Como o Doutor Torquato Jardim é um profissional com experiência e com cultura jurídica bem acima da média, não se deve debitar esse juízo equivocado à ignorância, tout court. Saísse de outro, talvez assim se pudesse avaliar tamanha derrapada, mas seguramente não no seu caso. Muito mais, parece que a declaração é típica para o processo de perseguição sistemática que se move contra Lula, com objetivo de lhe bloquear a participação nas eleições que muito provavelmente o reconduzirão à Presidência da República, como candidato de maior preferência dos eleitores. O Ministro da Justiça se coloca, assim, a serviço da manipulação e do amesquinhamento da soberania popular. Presta um desserviço à democracia, mas, sobretudo, como agente do estado brasileiro, é acessório à grave violação do direito internacional, contribuindo para macular ainda mais a má reputação atual do Brasil no concerto das nações.

Nunca é demais lembrar o veredito do Tribunal de Nuremberg, de 1946, que estabeleceu para todos os tempos o princípio da responsabilidade individual pela violação das normas de direito internacional peremptório. Disse o tribunal lapidarmente que tais violações não são praticadas por entidades abstratas, mas por indivíduos que comandam sua prática e somente em responsabilizando esses indivíduos é que se pode emprestar validade à norma internacional. É profundamente lastimável ter que se apontar para essa trágica lição, para recordar a juízes, promotores e autoridades executivas deste país que descumprir determinações decorrentes de obrigações assumidas pelo estado na ordem internacional não é apenas uma questão menor “interpretativa”, mas uma grave infração do direito das nações que pode ter reflexos na responsabilidade de cada um.

Tristes tempos.


https://www.brasil247.com/pt/colunistas/eugenioaragao/365712/Brasil-n%C3%A3o-pode-violar-tratados-e-Lula-%C3%A9-candidato.htm

terça-feira, 7 de agosto de 2018

A UNIÃO ALCKMIN E PP MOSTRA QUE BOLSONARO É SÓ UM SINTOMA DA VERDADEIRA DOENÇA: A MÍDIA OLIGÁRQUICA E AS ELITES.

Resultado de imagem para Alckmin e ana amelia
https://www.google.com.br/search?q=Alckmin+e+ana+amelia&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=0ahUKEwiDvLeUhdzcAhUJIJAKHY4pCBEQ_AUICygC&biw=1440&bih=794#imgrc=cOAT18kUdfre2M:

AO LONGO DA corrida eleitoral de 2018, entretanto, vai ficando evidente a farsa que era a máscara ética que vestiam as estrelas da mídia e seus patrões oligárquicos. O que a mídia brasileira agora faz é tão corrupto e obviamente enganoso que faltam palavras para expressar a repulsa que essa conduta merece – mesmo se tomarmos o menos exigente dos critérios como baliza.
Na disputa eleitoral de 2018, a mídia corporativa do país encontra-se abertamente unida em torno da candidatura de Geraldo Alckimin, governador de São Paulo e figurão do partido do establishment de direita, o PSDB. Para o público americano, ele pode ser descrito como uma versão mais conservadora da Hillary Clinton: ele habita a política há décadas, agindo como um serviçal bancado pelos interesses corporativos, ocupando de maneira inofensiva todos os cargos possíveis, confortavelmente acomodado e se beneficiando das boas relações que tem com o sistema neoliberal que alimenta a corrupção e lubrifica o sistema político.
Ele é o maior guardião do status-quo e da ordem estabelecida. Um candidato tão desprovido de qualquer tipo de carisma que é com frequência comparado a um picolé de chuchu. Em última candidatura à Presidência ele acabou com uma derrota arrasadora para Lula, perdendo no segundo turno por 21 pontos. A um observador americano, Alckmin lembra um Jeb Bush menos ousado, menos empolgante e com menos apoio popular.
Quanto mais o eleitorado Brasileiro vê Alckmin, mais ele é rejeitado: nas eleições de 2006, ele realizou um feito quase impossível: obter no segundo turno, quando concorria somente contra Lula, menos votos do que obtivera no primeiro turno, em que disputava votos com diversos outros candidatos.
Por boas razões, a principal estratégia política de Alckmin é se esconder. Ele não realiza comícios, porque ninguém exceto aqueles buscando uma cura para insônia iriam a um comício seu. Sua busca pelo poder depende exclusivamente de acordos de bastidores entre os donos poder, principalmente nas cidades médias no interior de seu reduto eleitoral, São Paulo, realizados no conforto das fortunas oriundas dos interesses oligárquicos a que ele serve – exatamente o sistema de corrupção legalizada que vem destruindo a política Brasileira (e também, a propósito, a política Americana), e o mesmo jogo-sujo com o qual a mídia finge se escandalizar.
Durante todo o ano de 2018, apesar do cada vez menos discreto amor que os órgãos da mídia dominante nutrem por ele, Ackmin vem agonizando anêmicos 6-7% nas pesquisas de intenção de voto. Como acontece nos EUA, no Reino Unido e em toda a Europa, grandes parcelas do eleitorado nutrem um desprezo tão grande pelo establishment que se recusam a votar em alguém que seja por ele apoiado ou associado.


Com o líder das pesquisas, o ex-presidente Lula, preso, – e muito provavelmente impedido de concorrer – os três candidatos que aparecem de maneira consistente como primeiros colocados são vistos (com ou sem razão) como outsiders: o congressista fascista Jair Bolsonaro, que deseja um retorno ao regime militar; Marina Silva, uma ambientalista negra e evangélica de fala mansa e valores conservadores oriunda da Amazônia; e Ciro Gomes, um político de carreira de esquerda extremamente astuto que se vê sem aliados ou coalizão (graças à uma esquerda irremediavelmente fraturada) e que vem tentando afastar a fama de encrenqueiro rebelde que o acompanha por toda vida.
O establishment brasileiro – liderado como sempre pelos enormes conglomerados de mídia controlados por um pequeno grupo de famílias bilionárias – passou o ano de 2018 inteiro em pânico porque, apesar das repetidas tentativas de ressuscitá-lo, o cadáver putrefato de Alckmin continua sem dar sinais de vida.
O PÂNICO DO ESTABLISHMENT se manifestou na semana passada em uma última tentativa desesperada de salvar Alckmin. O picolé de chuchu anunciou sua coalizão, selando uma ampla aliança em torno do chamado centrão: bloco composto basicamente pelos setores fisiológicos e parasitários do sistema político. Ele também anunciou sua vice: Ana Amélia Lemos, do partido de extrema direita PP (é sintomático da esclerose do sistema político brasileiro que o partido mais à direita do Congresso se chame Partido Progressista).
Para dizer o mínimo, nada nessa aliança pode ser considerado “de centro”. O Partido de Ana Amélia, que será alçado ao poder numa eventual vitória de Alckmin, era o domicílio político de Bolsonaro até 2015. Suas origens remontam ao partido ARENA, que dava sustentação ao regime militar que comandou o país até 1989, tendo chegado ao poder em 1964 com auxílio de um golpe que, com ajuda dos EUA, removeu do poder o governo de esquerda eleito pela população.
Nessa época, Ana Amélia trabalhava como jornalista, defendendo a ditadura nos veículos onde escrevia, e era casada com um senador indicado pelos militares. Sua visão política atual se encaixaria confortavelmente na extrema-direita do espectro político, mesmo nos EUA de Donald Trump.
Há poucas semanas atrás, após a presidenta do PT, Gleisi Hoffman, conceder uma entrevista à Al Jazeera denunciando a prisão de Lula, Ana Amélia subiu ao púlpito do Senado e– numa mistura quase perfeita de ódio xenofóbico e ignorância – confundiu e equiparou “Al Jazeera” e “Al Qaeda”, acusando a presidenta do PT de falar com terroristas e incitar o “Exército Islâmico“ contra o Brasil.
Por mais terrível que isso seja, o extremismo ideológico é a parte menos reveladora dessa equação. Essa enorme coalizão por ora alinhada com Alckmin existe para dar a ele o controle do dinheiro e do tempo de televisão que formam o alicerce das campanhas políticas no Brasil. O plano é enfiar Alckmin goela abaixo do eleitorado com tanta força, com tanto dinheiro, e com tanta propaganda televisiva que ele acabe engolido por pura inércia.
Mas há um fato ainda mais escandaloso, e que deixa ainda mais claro o verdadeiro caráter da mídia brasileira: o partido que virou o principal aliado de Alckmin, o PP de Ana Amélia, é o que tem mais envolvidos em escândalos nos quatro anos de Operação Lava Jato. Dos 56 representantes eleitos pelo partido em nível federal, 31 – mais da metade! – respondem a processos criminais.
Para concorrer à Presidência como um outsiderindignado com a corrupção, até Bolsonaro precisou sair dessa lama de corrupção e propina travestida de partido político. Ainda que Ana Amélia não esteja entre os que respondem a acusações na justiça, ela levaria junto consigo para os altos níveis de poder seu partido fundamentalmente corrupto.
Ana Amélia está longe de ser um exemplo de liderança ética: após dedicar sua carreira jornalística à defesa da ditadura, ela iniciou sua carreira política como funcionária fantasma indicada pelo seu marido senador, recebendo salários por seu “trabalho” no Senado ao mesmo tempo que ganhava a vida como “jornalista” pró-militares. É bom lembrar que o próprio Alckmin é acusado de ter recebido milhões de reais em doações ilegais não declaradas – o chamado caixa-dois – em suas campanhas eleitorais anteriores.
É esse, portanto, o grupo de criminosos que pode retornar ao poder, ajudado pelos “especialistas” e comentaristas da GloboNews, que passaram os últimos anos escandalizados com a corrupção e fazendo discursos apaixonados denunciando seus males e alardeando a urgência com a qual ela precisa ser combatida.
Estamos agora prestes a testemunhar um espetáculo revoltante: os mesmos comentaristas-estrela da GloboNews e colunistas políticos “de centro” que exigiram a remoção da presidenta eleita por causa de truques de contabilidade triviais estarão marchando em uníssono em favor de dois dos partidos políticos mais corruptos da América Latina, sendo um deles o detentor do recorde de Mais Parlamentares Acusados na Operação Lava-Jato.
A QUESTÃO PRINCIPAL da qual as elites nos EUA e no Reino Unido – ainda traumatizadas e incapazes de compreender ou explicar os fenômenos Trump e Brexit – passaram os últimos dois anos tentando fugir desesperadamente está agora mais clara que nunca no Brasil. O autoritarismo não surge aleatoriamente. Demagogos não se criam quando as instituições políticas são saudáveis, justas e igualitárias.
As ameaças à democracia liberal e às liberdades políticas só são possíveis quando a população perde a confiança nas instituições. É nesses momentos que a sociedade se torna vulnerável àqueles que ameaçam – ou prometem – “acabar com tudo isso aí”. É aí que os órgãos de mídia e os chamados especialistas perdem sua habilidade de alertar o público das mentiras e dos perigos: o público, com boas razões, vê essas instituições não como guardiãs contra o perigo e a injustiça, mas como seus responsáveis.
Quando a população vê essas figuras de autoridade como responsáveis pelo seu sofrimento, essas instituições pedem qualquer credibilidade para denunciar Trump, Brexit, Marine Le Pen ou Bolsonaro. Esses alertas se tornam não só inócuos, com também contra-producentes: quanto mais uma figura for odiada pelas autoridades da elite, mais atraente essa figura se torna para o grande público.
As elites nos EUA e no Reino Unido estão aprendendo essa lição da forma mais dolorosa possível. O mesmo se passa agora com as elites brasileiras. O comportamento que estamos testemunhando – união em torno de uma coalizão altamente corrupta, cujo propósito é única e exclusivamente manter e expandir a ordem existente, após anos fingindo querer exatamente o oposto – é justamente o que faz com que essas elites percam toda sua credibilidade para contrapor as ameaças reais à democracia.
Se as elites midiática, financeira e política querem entender porque a democracia brasileira está se desmanchando tão rapidamente, elas não devem perder tanto tempo analisando o fenômeno Bolsonaro. Seria muito mais produtivo uma boa e profunda olhada no espelho.
https://www.conversaafiada.com.br/politica/greenwald-globo-tenta-levar-um-grupo-de-criminosos-ao-poder-