O primeiro anúncio continha alguma ironia, creio eu. Não sonhe com liberdade, parecia dizer, mas console-se ao vestir jeans. O segundo, hoje impossível, aludia a um traço forte do caráter nativo, dado ao golpe baixo e ao passa-moleque. Quanto a Gerson, foi bom jogador, houve, porém, melhores, entre seus contemporâneos, na minha opinião, Ademir da Guia.
A publicidade dos dias de hoje, do curso de inglês, é representativa da parvoíce geral, do besteirol reinante. A nossa ignorância conta até com o reconhecimento mundial. Uma pesquisa recente, francesa, nos coloca em sexto lugar entre os mais atrasados.
A educação do povo nunca preocupou o Estado Nacional, desinteressado, como bem sabemos, do
Bem-Estar Social. Já houve tempos melhores muito curtos, no entanto. Quando cheg
uei a São Paulo, ainda menino, o colégio mais respeitado era público, instalado em prédio antigo e digno no Parque Dom Pedro, hoje área de mendicância e tráfico. A criminalidade mora ali.
Colégio muito concorrido, meu pai gostaria que o frequentasse. Não consegui vaga. A capital paulista tinha 1 milhão e meio de habitantes e 50 mil carros. No Carnaval, o corso passava pela Avenida São João, artéria principal.
Cidade limpa, pacata, civilizada. Destinada a um futuro exemplar de grande metrópole do Hemisfério Sul coerente com o seu passado, como o são, por exemplo, Melbourne e Sydney. De improviso, deu para se orgulhar de ser “a que mais cresce no mundo”. Deu no que deu.
Que se proclame a possibilidade de sermos todos bilíngues a curto prazo é uma hipérbole da sandice que não se dá por acaso. Sempre houve quem quisesse vender o elixir da longa vida e quem o comprasse.
O anúncio da tevê a que me refiro é, obviamente, insignificante comparado à disposição da maioria dos brasileiros de comprar elixires de porte e efeitos infinitamente superiores. Milhões bateram panelas e saíram às ruas de camiseta canarinho crentes de que a derrubada da presidenta Dilma escancararia as portas da felicidade.
Raros os que deram ouvido aos avisos: ruim com Dilma, pior sem ela. Precipitamos no caos, a cada instante a treva se adensa e vamos ao encontro de um desfecho trágico. E ainda muitos, legiões, não se dão conta disso.
Ocorre-me, pinçado ao acaso, a presidente do Supremo, Cármen Lúcia, a Tia Carminha das crianças inocentes. Na expectativa da cassação da chapa Dilma-Temer pelo TSE, ela se prepara a assumir a Presidência da República. Quem sabe não tenha reparado que o ministro Gilmar Mendes, seu colega e subordinado no STF, anda de mãos dadas com o presidente da República. De resto, quem não quer ocupar o trono? De chofre, poderia citar duas dúzias de nomes.
Espantosa é a pretensa normalidade da situação, a julgar pela reação de inúmeros cidadãos e do tom da mídia. A resignação do povo é tradição. Mas não haveria de tocá-lo o resultado do golpe de 2016: a punição do trabalho, a rendição ao neoliberalismo mais feroz, o corte nos investimentos em Saúde e Educação? Até quando haverá de resistir a chamada maldita “cordialidade”? E como se sentem os remediados? E a classe média-média?
Há quem diga que a
casa-grande vive e viverá em perfeita tranquilidade, indiferente às atribulações da maioria. A normalidade para ela nunca acabaria. Na comparação malposta, a aristocracia francesa vivia a normalidade até as vésperas da tomada da Bastilha. Verdade é que aquele era o século do Iluminismo, e este aqui nunca aportou.
http://www.cartacapital.com.br/revista/936/falta-o-iluminismo
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